As hierarquias determinam os níveis de poder, concedendo permissões ou limitações sobre as ações dum indivíduo em seu grupo ou sobre outros grupos. É o sistema que determina as classes e concede porcentagens de liberdade a cada indivíduo dentro de um regime de servidão.
A servidão é mantida por leis que delimitam a liberdade dos escravos modernos. A divisão social por categorias mantém o sistema estável. Os servos modernos precisam manter-se distraídos para que o fluxo de seus ofícios não se afaste da meta. Isso abalaria as estruturas dos andares mais altos lançando por terra o modelo que seguido desde os tempos feudais.
Uma dívida ao nascer
Tudo começa nos primeiros meses de vida, ao nascer herdamos uma dívida com a sociedade. Pela incapacidade de exercer qualquer função, os pais pagam pelo processo de preparação da criança para entrar no ciclo. Por pouco tempo experimentamos a liberdade e logo somos inseridos no jogo social, alcançamos a capacidade de assumir nossa dívida com o governo pelo resto da vida. O jogo consiste basicamente em aprender a produzir; produzir para consumir e consumir para manter o ciclo de produção e consumo que movimenta a engrenagem capitalista, geradora duma falsa liberdade que escraviza a humanidade integralmente e beneficia uma minoria cuja casta é mantida no topo duma grande pirâmide social.
O gerenciamento dos talentos
Identificados os talentos naturais de cada indivíduo, logo são explorados ao máximo em troca do mínimo e em prol de quem está há alguns níveis acima. A pirâmide social possui muitos níveis até chegar ao topo e em cada nível, existem guardiões que controlam o tráfego dos indivíduos que subirão ou permanecerão nos andares mais baixos. Estes guardiões são bancos, indústrias, empresas e representantes governamentais. A verdade é que no mundo utópico dos “homens livres”, todos estão acorrentados pela servidão ao deus dinheiro. Até mesmo os que pensam servir a um único Deus.
O culto invisível do deus capitalista
O dinheiro é uma espécie de deus controlador e consegue manter as massas distraídas com o trabalho escravo. Ele rouba o tempo e suga as energias de seus servos a ponto de perderem sua capacidade de autoquestionamento acerca de sua vida pessoal. Na prática capitalista tudo se vende, tudo se compra e logo se descarta. O dinheiro logo acaba e as pessoas recorrem aos templos modernos (caixas eletrônicos) para conseguir mais. Isso, porque tudo no mundo capitalista só pode ser adquirido através do dinheiro.
Ao comprar um pacote de viagem, entrar de férias, visitar um amigo ou parente, estamos pagando para cruzar fronteiras e obter créditos da liberdade que nos é roubada todos os dias. Ao caminhar pelas ruas observe a sua volta, câmeras, grades, fechaduras, alarmes, máquinas com senhas de acesso. Há sempre algo no caminho controlando nossos passos e para tudo é preciso permissão de acesso ou pedágio. As cidades são em verdade prisões ao ar livre e você costuma chamar sua cela de minha casa. E até mesmo sua casa tem um preço a ser pago pois nada é de graça e para tudo que precisar ter ou ser, terá de pagar para conseguir.
O governo e grandes corporações, controlam o ciclo social, tudo que for praticado pelo governo é legal e está acobertado por leis. Se algo é praticado da mesma forma por outrem, fugindo do controle sistêmico, tal prática passa a ser considerada ilegal. Pois, não se pode obter ganhos, por menores que sejam, sem ofertar e dizimar uma parte do ganho ao deus capitalista. Tomemos por exemplo o jogo do bicho, prática ilegal. Mas a megasena – outro jogo de azar – é permitida. Por que? Porque é regida e oferece ganhos ao governo.
Qualquer indivíduo que vender produtos fabricados por ele mesmo na garagem de sua residência será impedido de comercializá-los pela fiscalização. Afinal, em tudo que produzir, deverá ceder ao governo parte de seus ganhos, até mesmo quando adquirir algo, deverá pagar. A justificativa é a manutenção da governabilidade que sustenta reis e rainhas oportunistas com a maior parte retida, sobrando uma fração que será convertida em serviços mal prestados que não comporta atendimento a todos.
O trabalho
Aqueles que obtiverem lucros sem creditar o dízimo ao deus dinheiro, será punido. Por isso, é preciso trabalhar cada vez mais. Aliás, a palavra “trabalho”, vem do latim (tripalium) ou três paus – um instrumento de tortura usado para coagir os escravos ou animais a aumentar a produção. Atualmente trabalhar significa: vender tempo em troca de créditos para comprar liberdade limitada. Esses créditos permitem o pagamento das dívidas que se renovam a cada dia.
Uma sociedade controlada
O fato é que somos controlados em tudo que fazemos. Já observou as pessoas caminhando apressadamente pelas estações de trens, sistemas integrados de ônibus ou centros comerciais. Agora pense nas manadas dum grande fazendeiro, saindo para pastar pela manhã e voltando do pasto ao fim da tarde repetidas vezes até entrar na fila do matadouro e continuar gerando lucro para o grande fazendeiro que repetirá o mesmo processo com sua descendência. É assim que a sociedade funciona, as classes mais baixas trabalham mais e recebem menos, as mais altas trabalham menos e recebem mais e alguns isolados nunca trabalham e sempre recebem.
Ao contrário do que pensa a maioria, a hierarquia dos senhores de engenho sobre seus escravos nunca foi abolida. A assinatura da princesa portuguesa é pura poesia. Atualmente, somos “indústria e colaboradores”, o princípio da igualdade vale tanto quanto a assinatura da princesa Isabel. Na prática, os termos mudaram, mas na essência a servidão continua. Aos que vivem sob a crença da suposta liberdade concedida pela conquista dos direitos trabalhistas – resta a esperança de dias melhores garantidos por “direitos constitucionais”. LEIS regentes de uma democracia de aparências, no qual um bolo de excremento é ornado com flores de jasmim. Distraídos os escravos de todas as cores e crendices, alegram-se diante dos benefícios mínimos concedidos pela generosidade dos grandes inflamadores de plateias sedentas.
Mão-de-obra fabricada
Em verdade, temos nossas mentes moldadas durante a infância e crescemos sob as dependências do medo incutidas pelas limitações daquilo que nos fora permitido diante de um conjunto de leis que privilegiam quem está no topo e impõe regras para que as classes menores não ultrapassem o andar de cima por onde pavoneiam os narizes empinados em sua soberba magistral. Assim continua a maioria a prostituir suas qualidades em detrimento da fiel submissão entranhada no inconsciente coletivo, garantida pelas próximas gerações de mentes medíocres que se contentam em deixar as coisas como estão, ignorando o fato de que a união das classes pode sacudir os andares de cima e quebrar os paradigmas que sustentam o poder sobre os indivíduos comuns.
A igualdade e liberdade podem conviver em harmonia. O poder requer divisões e não faz acordos igualitários, na grande pirâmide das classes, a maioria dos indivíduos serve aos senhores que não servem a ninguém.
Utopia social
A ideologia de uma sociedade perfeita sempre apontou para o futuro próximo. Porém, um futuro constantemente adiado. E mesmo sabendo de toda a verdade por baixo dos lençóis finos da corrupção, à desobediência das leis e a impunidade diária no mundo dos pavões democráticos – o povo prefere sujar os olhos com mentiras ao limpá-los e abrir a boca diante de dessa enxurrada de mudanças e progressos vindouros narrados por sorrisos falsos, frases feitas e construções inacabadas. De resto deparamo-nos com uma alegoria de emoções escusas a omitir uma briga de cães famintos, cujo objetivo é garantir a maior fatia de carne possível, no cume de um grande cadáver social, asfixiado pela submissão de um povo que em sua maioria: muito quer, tudo sabe e nada faz.
Valorizar os valores e não os comercializar
Será que vale a pena continuar cometendo os mesmos erros, seguindo as mesmas diretrizes e apoiando as mesmas ideologias? Será que um dia a maioria entenderá que o caráter, a honra, a ética e a moral devem estar cima de qualquer coisa? Que a honestidade é uma dádiva e a liberdade – hoje para poucos – não deve ser comprada em frações mínimas a preços altos e somente pela servidão?
A manutenção da sociedade exige que de alguma forma contribuamos com nossa mão-de-obra. Mas isso não significa que tenhamos de doar a maior parte de nossas vidas para ter um mínimo de liberdade comprada para ser vivida nos finais de semana.
Por enquanto, o mais próximo que podemos alcançar da liberdade é trabalhando com aquilo que gostamos de fazer, que é feito com prazer e em conformidade aos talentos que cada um possui. Mas não é só isso. Deve-se valorizar os valores e não os comercializar pelo voto, por favores, por sentimentalismos, piedade, torcida, ideologias não compreendidas e crendice. Se as pessoas continuam sendo escravas da sociedade é porque continuam permitindo que sejam comercializadas e também continuam a comercializar seus valores… Poucas pessoas no mundo são realmente livres.
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